Certas historias merecem ser contadas e com certeza a carreira de Milton “Bill” Finger, americano nascido em 1914 na cidade de Denver é uma dessas.
Infelizmente se trata de um reconhecimento tardio sobre seu importante papel na criação do Batman e inúmeros elementos que cerceiam o personagem.
As contribuições dele começaram antes do lançamento, Bob Kane o procurou para apresentar Bat-Man, um herói que poderia alcançar o mesmo sucesso de Superman, lançado meses antes por dois jovens artistas.
Bill Finger trabalhava vendendo sapatos mas já era conhecido por sua criatividade em trabalhos que foram publicados, tentava seguir na carreira de roteirista e suas ideias foram mais que determinantes para o sucesso do homem morcego, a começar pelo ajuste do nome para a forma que conhecemos, "Batman". A cidade de Gotham, o tom de suspense policial das aventuras, a Bat Caverna e o Batmovél são apenas alguns desses detalhes que existem até hoje e que foram criados por ele. Trabalhando no escritório da editora onde ficaria por alguns anos ele escreveu inúmeras histórias, a primeira da Mulher Gato, do Coringa, Pinguim e fez mais, acabou contribuindo para a criação do primeiro Lanterna Verde, assim como Charada, e Robin, (personagens que o desenhista Jim Robinson afirma ter também contribuido, ampliando ainda mais a profundidade dos segredos dos bastidores dessa história).
Mas por anos apenas Bob Kane era citado como criador, uma exigência dele próprio expressa em contrato.
O motivo da ocultação dos créditos de Bill era basicamente uma manobra de Bob, que certa vez foi procurado pelos criadores do Superman, Jerry Siegel e Joe Shuster para juntos exigirem maiores participações nos lucros, lembrando que os três haviam vendido seus personagens, mas queriam melhorar o acerto. Bob tanto não aceitou como ainda teria revelado os planos de seus colegas a editora, mas não ficaria só nisso, Kane conseguiu fazer seu contrato ser refeito, alegou ser menor de idade na ocasião do acordo e como não possuia documentos acabou levando a melhor, garantindo uma maior participação e impondo a condição de ser eternamente citado como o único criador do personagem.
Batman foi lançado em 1939, mas a importância de Bill Finger só foi conhecida através de uma conversa informal em uma feira de quadrinhos no ano de 1965, em uma estrutura simples onde fãs e criadores podiam ter contato, nomes importantes conheceram Finger, que pôde contar sobre suas contribuições assim como sua magoa. Era bem clara a vontade em ser reconhecido, e para isso não queria um centavo sequer, apenas a satisfação e orgulho em ser lembrado. Em resposta a essa repentina notoriedade do colega, Bob Kane que escrevia uma coluna em uma revista dedicada a fãs do Batman negava a importância de Finger, dizendo que sua participação foi ínfima.
O mais próximo que Finger conseguiu em vida foi ver seu nome nos créditos da famosa série dos anos 60, quando escreveu um episódio. Foi citado como roteirista, sem qualquer menção a criação do herói.
Bill Finger faleceu em 1974 aos 59 anos, de vida simples e solitária foi enterrado sem cerimônias em um cemitério onde era identificado apenas por um número na lápide.
Em 1989 Batman chegaria aos cinemas, um marco da celebração de seus 50 anos de existência, Bob Kane marcou presença na estréia, orgulhoso de sua obra e seu reconhecimento, se tornou ainda mais popular, a ponto de lançar sua biografia pouco tempo depois, onde de forma impressionante não omite que Bill teve uma grande importância na criação do personagem após anos negando tal fato.
Antes do lançamento do filme, Frederick Finger, filho de Bill procurou o estúdio e contou que o maior desejo do pai seria ter seu nome citado, mas ainda não seria dessa vez que ele seria creditado por sua obra. Esse foi um dos únicos esforços de Frederick que infelizmente viria a falecer tempos depois vitimado por complicações causadas pelo HIV.
A história esfriou um pouco, aparentemente após a morte de Bob Kane parecia que Bill Finger nunca teria o merecido reconhecimento. Mas o historiador Marc Tyler Nobleman, escritor e biógrafo que por 10 anos se dedicou a história dos criadores do Superman acabou por se interessar por Bill Finger e introduz Athena Finger, filha de Frederick a essa historia. A neta do roteirista se interessa e ambos vão a fundo, judicialmente inclusive em busca do devido reconhecimento ao falecido avô, dentre tantas pesquisas, Marc se aproxima do biógrafo de Bob Kane que lhe revela os áudios das gravações de suas entrevistas com ele, onde Bill e sua importância são citados de maneira veemente. Isso acabou sendo somado a um caderno com anotações minuciosas do próprio Finger, contendo cada ideia, cada detalhe e que corroborava ainda mais a historia que foi finalmente provada, aceita e confirmada. A partir daí a Warner passaria a citar o autor em todo material do Batman que fosse lançado dali em diante, em Batman Vs Superman foi a primeira vez que isso aconteceu em um filme relacionado ao personagem.
Esse belo trabalho de busca pelo reconhecimento resultou no livro Bill the Boy Wonder: The Secret Co-Creator of Batman (2012), onde a vida desse grande artista é celebrada e recontada de forma rica em detalhes, que inspiraram um documentario chamado Batman & Bill (2017) criado pela empresa de streaming HULU, uma concorrente da NETFLIX que infelizmente não temos disponível ainda no Brasil, mas consegui assistir pelo Youtube, o qual o canal será postado caso alguém se interesse pelo conteudo, porém ele foi disponibilizado sem legendas.
Ao final, Marc Tyler Nobleman fez um trabalho elogiavel mas lamentava o final de vida tão simples, quase anônimo de Bill Finger, principalmente se comparado lápide de Bob Kane, ornamentada com informações e artes que o apontam como grande criador do Batman, mas Athena lhe disse que o pai, Fred, retirou seu avô, pediu para que seus restos mortais fossem cremados e um dia os levou a uma praia em Oregon onde desenhou um enorme morcego na areia, depositou as cinzas no centro e esperou as ondas leverem tudo ao mar.
Hoje em dia Bill recebeu prêmios póstumos, faz parte do Hall da Fama das Historias em Quadrinhos, virou nome de rua e de prêmio também.
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